Do papel à blogosfera
A palavra como semente em terra fértil
Ao
navegar na Internet, na quarta-feira, li que 20 de março é o Dia do
Blogueiro. Mas não encontrei nada que confirmasse a informação. Para
mim, todo dia é dia para quem escreve. Blogueiro. Confesso, não gosto da
palavra.
Parece-me,
não estou só. O jornalista Alberto Dines contesta o termo. Em relação à
jornalista cubana Yoani Sanchez, Dines escreveu: “Yoani não é
blogueira. Blog não é ofício, nem status profissional, é formato de
veículo. Ninguém diz ‘fulano é revisteiro’, diz ‘fulano é jornalista’
porque hoje pode estar num semanário e, amanhã, à frente de um vistoso
blog”.
Mas,
isso pouco importa. Gosto do exercício da escrita, que me dá
satisfação, embora, muitas vezes, essa prática seja tão penosa como a
labuta de quem quebra pedras. Falta-me a facilidade dos grandes
escritores, no manejo da palavra. No seu afã e habilidade, o texto
desses homens e mulheres flui como as águas de um rio.
Apesar
da limitação de quem não teve tanto acesso aos livros na infância,
havia a sede da palavra (meu material escolar se resumia a um pequeno
caderno e lápis grafite, com uma borracha na cabeça, em um saco plástico
transparente). Mesmo sendo muito tímido, sempre arrisquei quando a
professora primária mandava fazer uma composição, nome da redação,
naquela época.
As
primeiras letras na escola estimularam a pretensão. Decidimos criar um
“jornal”. Assim, nasceu “O Beija-Flor”, de apenas uma página,
manuscrita, que passava pelas mãos de uns cinco colegas em sala de aula.
Depois, passamos a colaborar com jornais. Aumentava, digamos, a
interação. A resposta de alguns “leitores”, poderosos, que se sentiam
contrariados, não era exatamente o que se poderia chamar de pacífica.
Eis
que chegamos à era tecnológica, com os blogs. Um novo suporte para a
escrita, com múltiplas possibilidades de disseminação de conteúdo.
Texto, fotografia, áudio e vídeo num mesmo espaço. A convergência das
mídias. A notícia e a opinião. O comentário do leitor, por vezes
agressivo e tingido pelas cores que revelam a paixão e a preferência
político-partidária, é combustível para a resposta à altura, com
respaldo nos fatos e nos argumentos.
A
condição de moderador, no entanto, inibe o impulso contra o desaforo.
Mostra que a lâmina que corta pra lá, também dilacera pra cá. Pela falta
desse controle, muita gente já não vive. Um mínimo de razão vence a
emoção. Então, melhor seguir o conselho bíblico e optar pela palavra que
abranda o furor e, como uma espécie de bálsamo, trata as feridas à flor
da pele.
Fascina-me
na blogosfera, quando seu potencial de hiperlink desfaz fronteiras e
aproxima pessoas, remetendo à sabedoria do poeta Vinícius de Moraes. “A
vida é a arte do encontro, embora haja tantos desencontros pela vida”.
Com os olhos da fé, listo dois fatos, como providência divina, em que o
blog se constituiu em mero instrumento.
Uma
norte-rio-grandense de Ipanguaçú, residente no Rio de Janeiro,
encontrou o blog via sistema de busca do Google e, através dele, a
madrinha, em cuja casa, há 30 anos, morou. Também após 30 anos, um jovem
capixaba conheceu o pai que o deixara, com sua mãe, quando tinha 12
anos.
Do
suporte de papel à impressão virtual, são muitos anos. Escrevo como
quem busca no lugar distante a pessoa amada. Uma palavra atrás da outra.
Persisto como o agricultor que lança a semente em terra fértil e
vislumbra o trigo que será pão para saciar a fome da criança.
Navego
nesse ciberespaço e corro atrás da oportunidade para a
construção/desconstrução, a afirmação e o contraditório do dito e do
não-escrito. Esforço-me para conceber a interação como alma e essência
da blogosfera. Tenho esperança de que, qualquer dia, as palavras
reunidas aqui caiam nos corações das pessoas, como sementes numa terra
boa e produzam bons frutos.
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